Clube dos Escritores 50+ Carlos de Castro Impressões afetivas

Pequena crônica sobre impressões afetivas
por Carlos de Castro

          Corria uma terça feira comum, como qualquer terça feira agitada de São Paulo. Trânsito pesado, calor modorrento de verão, chuvas fortes previstas para o fim da tarde. Tomei coragem e parti, logo após o rápido almoço, para o revigorante exercício de uma visita eventual. Sim, é possível encontrar espaço no meio do dia a dia para visitar pessoas, lugares, coisas que fogem ao rotineiro. Visitas esporádicas ou até mesmo acidentais que invadem o terreno da vida que passa ao lado, da maravilha do mundo que gira conosco.

          Dessa vez fui a uma gráfica, empresa criada por um velho amigo com quem, infelizmente, há muito havia perdido contato.

          Ele me mostrou com orgulho todas as instalações, o belo e imponente equipamento offset e a poderosa impressora digital. Apresentou e destacou a importância dos técnicos que as pilotavam. Falou dos produtos principais da gráfica, sobre as adaptações que o setor sofreu a medida que o mundo digital cresceu e invadiu a vida de todos. Quem diria, seus principais produtos atualmente são ligados ao setor da tabacaria.

          Falou disso e daquilo, enquanto percorríamos todo o grande galpão, até que chegamos ao seu escritório. Ofereceu-me um café, esboçamos uma pequena conversa sobre coisas que aconteceram nesse longo intervalo em que não nos encontramos. Não havia tempo ali para colocar em dia tantos assuntos. Mas foi uma retomada importante. Creio que para nós dois ficou claro que precisamos dar um jeito de reativar nossa amizade. Falamos também, claro, sobre a possibilidade de imprimir livros, uma prospecção de quem, como eu, gosta de escrever e é aficionado pelo mundo dos livros.

          O que mais me chamou a atenção, entretanto, veio de outra direção, foram comunicações, talvez até inconscientes, vindas de outras plagas, de outra natureza. Primeiro foi o carinho com que me apresentou, e depois chamou para nossa conversa, o seu filho, Eduardo, seu braço direito na gráfica. Pouco depois foi impossível deixar de notar o brilho nos seus olhos quando falou da filha Renata, que estava grávida do segundo filho e trabalha também com eles, mas em ‘home-office’.

          Nesse momento comecei a conhecer a verdadeira essência daquela gráfica. Percebi com clareza, como se uma luz exterior tivesse de repente invadido o escritório onde conversávamos. O que meu velho amigo estava imprimindo mesmo era um belo legado, uma aplicação prática do espírito da esperança vencendo a sociedade do medo.

          Foi isso. Fui feliz nessa visita. Percebi que, muito mais do que a criação de variados produtos gráficos, o que existe mesmo, e se pratica lá todos os dias, são impressões afetivas. É uma Gráfica de Amor.

Um comentário

  1. Que delicia a sua crônica. Vida! Uma lembrança do possível. Um possível que nos assalta como dificultoso.
    Creio que o afeto é a única e possível realidade, nao semente hoje nos assaltos do cotidiano que nos roubam a fé
    na paz. O afeto que emana de um dia que parece nao trazer nada de extraordinário mas que derrete o coração engessado
    e duvidoso se ele existe ou mesmo se nós estamos aptos a recebê-lo, dar, trocar!. Gosto sempre de seus escritos.
    abraço
    B

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