Clube dos Escritores 50+Leo Forte istórias de detetives

As melhores histórias de detetives,
por Leo Forte

Léo Forte fala de suas histórias policiais favoritas. Ingredientes: criminosos perversos, detetives durões e mulheres sensuais e perigosas.

Sabe como surgiram os livros policiais e as histórias clássicas de detetives, aquelas que todo mundo reconhece como “literatura noir”?

Pois então, esse tipo de história nasce nos Estados Unidos, pouco depois da Primeira Grande Guerra, quando revistas pulp, como eram chamadas as publicações baratas e sensacionalistas, impressas em papel amarelado, começaram a dar chance para autores que quisessem publicar histórias violentas, mas cheias de humor, que escondiam, sob tramas aparentemente despretensiosas, críticas contundentes à sociedade americana.

Nelas estavam os principais elementos da literatura noir: tramas repletas de crimes, tipos durões de raciocínio rápido, ação alucinante, autoridades corruptas, mulheres belas e traiçoeiras. Os personagens são marcantes, trágicos, às vezes divertidos, deprimidos ou conformados. Pessoas que conseguem sobreviver à violência urbana e ao destino sombrio das grandes metrópoles.

Escritas em uma linguagem simples e direta, tirada das ruas, das mesas de bar, prisões e delegacias, as histórias conseguiram ao mesmo tempo sucesso popular e da crítica que nos fins dos anos 20 batizou este estilo de hard-boiled.

Esse tipo de ficção urbana, amoral, violenta, repleta de personagens novos na literatura, estimulou outros escritores igualmente talentosos a manterem este estilo que acabou rendendo clássicos do cinema como Falcão Maltês, Relíquia Macabra, Pacto de Sangue e O Destino Bate à Sua Porta, consagrando os atores Humphrey Bogart e John Garfield.

Fiz uma lista dos meus favoritos. Veja se você concorda comigo:

DASHIELL HAMMETT (05/1894 – 01/1961)
Abandonou a escola com quatorze anos e trabalhou como mensageiro, entregador de jornal, escriturário, apontador de mão-de-obra e estivador, entre outros empregos. Aos 20 anos, foi trabalhar na Agência Pinkerton como detetive onde ficou até 1922 quando demitiu-se para se dedicar à literatura. Suas histórias começaram a ser publicadas em revistas baratas e populares como Black Mask e Smart Set. Imediatamente chamou a atenção do público e da crítica e foi reconhecido como um grande escritor, criador do romance policial moderno. Hammett, apontado como o precursor da literatura noir, foi responsável por tirar o gênero do marasmo de crimes cometidos em mansões por mordomos assassinos que já durava décadas, além de cunhar o protótipo do detetive durão que viria a marcar a literatura do século 20.

Entre seus personagens mais marcantes estão o famoso investigador da agência Continental OP, um “durão” que nunca é chamado pelo nome e Sam Spade com imagem associada a Humphrey Bogard, pela sua atuação no filme Falcão Maltês.

Depois de Hammett, a investigação criminal mudou. Através dos personagens San Spade e Continental Op os leitores “viviam” a investigação, descobriam os motivos de um crime e seus assassinos, numa época em que não se liam detalhes sórdidos sobre a violência, sangue, tiros certeiros e facadas passionais nas páginas dos jornais nem nas telas da TV.

Não deixe de ler:

Tiros na noite Vols. 1 e 2
20 histórias de Hammett que permaneceram fora das livrarias nos quarenta anos após a morte do autor. São contos ambientados em um mundo corrupto onde o crime organizado é rei e em que o ganho desonesto e as paixões violentas regem as vidas humanas. Este primeiro volume é dominado pela figura de Continental Op, o durão e taciturno detetive particular de São Francisco, sempre cercado por vítimas, traidores e cadáveres e dono de uma habilidade única para chegar à verdade das coisas.

O Falcão Maltês
O enredo do romance policial mais famoso do século 20 gira em torno de uma relíquia medieval valiosíssima – a estatueta de um falcão – que é levada em sigilo desde o Oriente até a cidade de São Francisco, na Califórnia. Em seu rastro seguem aventureiros gananciosos que fazem de tudo para possuí-la. O detetive Sam Spade, imune a ilusões sentimentais, habituado a lidar com gangsters e policiais corruptos, entra nessa batalha.

RAYMOND CHANDLER (07/1888 – 03/1959)
Depois do divórcio dos pais, em 1896, foi morar com a mãe em Londres. Criado na Inglaterra, continuou sendo cidadão americano e voltou para os EUA em 1912 . Tentou ser jornalista, empresário, detetive e até executivo de uma companhia de petróleo. Desenvolveu o gosto pela literatura e devorou livros durante a vida inteira. Nos anos 30 publicou histórias policiais na Black Mask Magazine. Em 1939 publicou , seu primeiro romance, The Big Sleep, apresentando o detetive Philip Marlowe, herói de mais seis romances (Adeus Minha Adorada, 1940, Janela para a Morte, 1942, A Dama do Lago, 1943, A Irmãzinha, 1949, O Longo Adeus, 1953 e Playback, 1958).

Philip Marlowe ,assim como o Sam Spade de Hammet, são críticos em relação às estruturas sociais ao seu redor e suas ações se dão num ambiente inserido na marginalidade. Homens de ação, com uma percepção que provém de seus conhecimentos práticos sobre o comportamento dos seres humanos. Assim, são próximos dos tipos marginais com que lidam. Suas personalidades se caracterizam pelo sarcasmo, pela violência e pela desilusão.

Chandler escreveu roteiros para Hollywood e teve todos os seus livros adaptados para o cinema, em filmes nos quais trabalharam grandes astros e estrelas de Hollywood, como Humphrey Bogart, Lauren Bacall, Robert Mitchum, Charlotte Rampling, James Stewart, Robert Montgomery, James Gardner, Elliot Gould, entre muitos outros. Tornou-se alcoólatra após a morte de sua mulher em 1956, e morreu em Los Angeles consagrado como um dos maiores escritores americanos de todos os tempos.

Não deixe de ler

A simples arte de matar – vol. 1
Este livro contém todos os ingredientes que o consagraram como o mestre da literatura policial noir: assassinos, policiais corruptos, homens duros de coração mole, solitários, perdedores esmagados pela cidade grande e instituições injustas. São quatro contos e um ensaio sobre seu personagem Philip Marlowe.

O Longo Adeus
Mais que um policial, este livro é um apanhado de observações sobre a sociedade americana, com uma grande trama ao fundo. O personagem principal, detetive particular Philip Marlowe, é um “sir Galahad”, que percorre desde a high society até os becos mais imundos com uma fé inabalável no seu dever de agir corretamente, mesmo sabendo que neste mundo tem de se jogar duro.

ROSS MACDONALD (12/1915 – 07/1983)
Cresceu no Canadá e voltou aos Estados Unidos em 1938. Como grande parte dos escritores norte-americanos da época, iniciou a carreira literária publicando contos em revistas. Enquanto estudava na Universidade de Michigan concluiu seu primeiro romance, The Dark Tunnel, publicado em 1944, sob o pseudônimo de John Macdonald até que chegou ao pseudônimo definitivo de Ross Macdonald. No início da década de 50, Macdonald radicou-se na Califórnia, estabelecendo-se pelos próximos trinta anos em Santa Barbara, onde se passa a maior parte de seus romances – ainda que neles a cidade chame-se Santa Teresa.

Seu personagem Lew Archer, detetive particular durão, herdeiro da tradição de Chandler e Hammett, apareceu pela primeira vez em 49, no romance The Moving Target (O alvo móvel), adaptado às telas do cinema em Harper de 66, estrelado por Paul Newman. O nome Lew Archer seria uma homenagem a Dashiell Hammett, cujo personagem, Sam Spade, tem como parceiro Miles Archer.

O autor se tornou célebre devido às histórias protagonizadas por Archer, 18 romances e vários contos. Foi o “caçula” da geração que revolucionou a literatura policial, elevando-a de pulp fiction a grande arte. Firmou-se como um dos grandes escritores norte-americanos do século 20 e seus romances foram elogiados pela crítica e pelo público.

Não deixe de ler

Dinheiro Sujo
Nessa aventura, Archer é contratado por um milionário glutão que quer reconquistar sua ex-noiva, agora sob o fascínio de um suposto exilado político. Cabe ao detetive desmascarar o exilado para que seu cliente possa alertá-la sobre os perigos implícitos na ligação com tal mentiroso. Mas o que acontecerá se a verdade não for exatamente a que ele espera?

A Piscina Mortal
Inicia à maneira das clássicas histórias do gênero: uma mulher misteriosa e elegante contrata os serviços de Archer, para tentar descobrir quem enviou ao seu marido cartas que a acusam de adultério. Este é o primeiro passo que levará Archer para dentro de uma família problemática e não demorará até que o cadáver da milionária matriarca apareça boiando na piscina.

DAVID GOODIZ (1917-1967)
Queria ser um dos grandes da literatura norte-americana. Acabou se tornando um dos grandes da literatura policial norte-americana. O motivo é simples: precisava comer. Não podia se dar o luxo de ser artístico sem dinheiro no bolso e, consequentemente, com a barriga vazia.

Nascido na Filadélfia, fez de sua terra natal o palco pestilento e cruel a abrigar vidas infelizes, vencidas e desencantadas. Melancolia, apatia, desespero, solidão e violência são os únicos sentimentos que elas entendem e cultuam. Seu realismo, repleto de brutalidade, não comporta esperança nem finais felizes e, para retratá-lo com fidelidade, Goodis emprega uma linguagem ao mesmo tempo áspera e poética, densa e árida, com frases curtas e estranhas imagens como “a lua, bela e limpa, refletida na poça de uma sarjeta infecta”.

Goodis é daqueles autores que não te deixam em paz até que você se liberte por completo dele e para isso, é preciso chegar à última linha do livro. Seus personagens têm uma força diferente, personalidades mais rijas, pessoas intransponíveis, ainda que façam parte da ala dos vencidos, dos fracos. Mesmo não sendo culpadas, estão quase sempre em fuga, seja do passado ou do presente, e o melhor paliativo que encontram é a bebida. Os livros de Goodis são altamente alcoólicos, o uísque verte das páginas como uma fonte de água mineral.

As tramas de Goodis também não seguem a cartilha de autores clássicos do romance policial. A trama, em seus livros, é importante, claro, há sempre aquele suspense pairando no ar, mas não é nunca um quebra-cabeça. A trama está sempre a serviço do personagem, nunca o contrário.

Seu primeiro romance, Retreat from Oblivion, foi publicado em 1938, quando tinha apenas 21 anos. Ele ganhou certa notoriedade em 1946, com a publicação de Dark Passage, que foi levado às telas de cinema sob o mesmo nome (o filme foi lançado no Brasil como Prisioneiro do Passado), estrelado por Humphrey Bogart e Lauren Bacall. Goodis trabalhou como roteirista para a Warner Brothers, como era comum entre escritores da época.

Escreveu dezenove livros. Apenas quatro foram publicados por aqui (Atire no pianista, A lua na sarjeta, A garota de Cassidy e Sexta-feira negra), todos verdadeiras obras-primas. Em um país em que Bukowski se deu tão bem, os beberrões malditos de Goodis certamente mereciam melhor sorte.

François Truffaut filmou Atire no pianista, estrelado por Charles Aznavour. O sucesso do filme foi de tal ordem que o livro mudou de nome: era Down There e tornou-se Shoot the piano player. Além desse, também fizeram sucesso no cinema: Lua na Sarjeta (La lune dans le caniveau) de Jean-Jacques Beinex, com Gerard Depardieu e Nastassja Kinski, e o já citado Dark Passage, que por sinal, foi objeto de uma disputa judicial que se arrastou até após a morte de Goodis. Ele acusou a United Artists e a rede de TV ABC de terem se apropriado da ideia do livro para criar o célebre seriado e o filme O Fugitivo. Em decisão histórica para o direito à propriedade intelectual, a Suprema Corte dos Estados Unidos deu ganho de causa a Goodis.

Morreu em decorrência de ferimentos recebidos em uma briga de rua, aos 49 anos. Exatamente como os brigões e arruaceiros que engrossam o caldo de sua literatura.

Bem, meus amigos, estou com os quatro livros (Atire no Pianista, A Lua na Sarjeta, Garota de Cassidy, Sexta-Feira Negra) aqui na minha frente e não consigo decidir qual recomendar. Então peguem qualquer um deles, todos são ótimos e as características estão no que foi dito acima. Tenho certeza que depois de lerem um, vocês sairão atrás dos outros. Eu fiz isso, comecei por Atire no Pianista.

Até nosso próximo encontro e bom divertimento com os escritores hard-boiled. Como sempre, se vocês quiserem fazer algum comentário ou sugestão podem escrever para [email protected]

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Leonardo Forte (Léo), 73 anos, economista, publicitário aposentado, casado, dois filhos e uma neta. Apaixonado por cinema, literatura e música, escreve contos e promove encontros para ensino de jazz.

Um comentário

  1. Léo, que preciosidade!
    Vou guardar essa lista. Adoro o Falcão Maltês, e adoro a grande companheira de Hammett. Lillian Hellman, que dupla. Lembra do filme Júlia?
    Bjs

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