A barra de chocolate Kopenhagen escondida na gaveta de camisolas. As garrafas de refrigerante Crush na porta da geladeira, o único refrigerante que eu detestava. O estalinho dos seus joelhos passando para ver se estávamos dormindo. O cigarro Charme repousado no cinzeiro. Os vestidos de poás. O barulho do salto dos seus sapatos. Os brincos de pérola. A bolsa recheada de bolsinhas, todas arrumadas por tamanho! Ah como eu gostava de mexer na sua bolsa! A voz suave. O riso tímido. O orgulho dos filhos – apesar de sermos os dois bastante destrambelhados…
Você achava o Clark Gable o homem mais lindo do mundo. E o Blota Junior, um homem muito inteligente. Sei que quando era pequena queria ser menino para jogar bola na rua. E que começou a trabalhar muito cedo, com o Benedito. E que era muito amiga do Juscelino e que ele dançava muito bem. Lembro que brigávamos muito, e quando eu pedia desculpa você dizia: de que adianta se você vai fazer malcriação de novo? E isso me dava um raiva danada.
Não sei para qual time minha mãe torcia. Qual era seu prato favorito. Nunca perguntei se estava bem, se precisava de alguma coisa, se se sentia sozinha depois que papai morreu. Vejo nos meus filhos tudo que não fui. Os abraços que não dei, a atenção que não prestei, a companhia que não fiz, o carinho que não trocamos.
Sempre soube onde estavam escondidas as barras de chocolate da Kopenhagen, mas nunca contei pra ela. Sempre soube que a amava muito, mas nunca contei pra ela. Eu sempre soube que mesmo assim ela me amava muito. Porque ela nunca cansou de me contar.